27 de jul. de 2012

Lulinha e o pé da plataforma

      Há tempos, no fundo do mar, vivia a uns bons quilômetros de Macaé, um sofrido Polvo. Ele tinha um caso amoroso, que demorou a se concretizar, com uma lula conhecida como “Lulinha”.
    Lulinha era muito esperto e tinha grande capacidade de comunicação com toda a comunidade do fundo do mar.
    A relação entre Lulinha e Polvo enfrentara grandes reações contrárias da biota conservadora do fundo do mar, por ser a primeira união homossexual lá, naquelas profundezas. O Polvo enfrentou tudo porque era muito interesseiro e assumiu a relação pensando que rapidamente sua vida iria melhorar.
    Com o passar do tempo, a situação não melhorava para o Polvo que, pela primeira vez, xingou o companheiro:
    - Seu safado Você só pensa nos prazeres da bebida, do sexo e da popularidade. Se o ambiente continuar assim, não mais teremos condições de viver aqui. Por que você não consulta os seus amigos para encontrar uma solução?
    Lulinha ficou sensibilizado com a bronca do companheiro e começou a querer tomar alguma atitude. Procurou, primeiro, o seu colega da comunidade, uma lula que tinha muita força e se chamava Paulinho. E perguntou:
    - Companheiro Paulinho, o que você acha que posso fazer para melhorar o nosso habitat?   
    Paulinho pensou, e pensou, e falou:
    -Lulinha, acredito que o causador de todos estes problemas ambientais é esse pé de plataforma que apareceu aqui no fundo do mar. Você lembra a barulhada que começou quando ele apareceu? Temos que cortar este pé maldito.
    Lulinha não ficou satisfeito com a resposta. Ele antes gostava de atitudes radicais, mas agora acreditava na negociação, no conchavo, usando até mesmo a troca de favores e favorecimentos.
    Resolveu então procurar outro companheiro. Pensou e lembrou-se de uma lagosta que não era muito bonita, mas tinha muitas habilidades técnicas, difíceis de encontrar em um fruto do mar. Era uma lagosta chamada Vilma, em quem muito confiava.
    Foi até Vilma e perguntou:
     - Ô Vilma, minha querida, o que você acha que posso fazer para melhorar o nosso habitat?   
    Vilma era muito direta e durona. Não media suas palavras e disse:
    - A situação está ruim e pode piorar ainda mais se você não agir. Se este pé da plataforma arrebentar, não sei o que será da nossa comunidade. Trate de subir neste pé e vá negociar com o Gigante. Dizem que ele mora lá na copa que alguns afirmam existir no alto.
    E Lulinha lá se foi. Subiu, subiu e subiu. Descansou e subiu mais ainda. Finalmente chegou numa parafernália enorme.
    Lulinha ficou abismado ao ver tudo aquilo. Começou a subir na parafernália e fez contato com a primeira coisa estranha que estava se movimentando. Era um homem que, tão logo o viu, veio correndo em sua direção.
    Lulinha se apresentou:
    - Sou o líder da comunidade dos frutos do mar desta região.
    O homem, aparentemente muito compreensivo, cuidou de criar condições para que Lulinha sobrevivesse naquele ambiente inadequado para um fruto do mar. Colocou-o, portanto, em um balde com água.
    O homem falou:
    - Eu me chamo Antônio Orlando e trabalho para uma empresa terceirizada pelo gigante para operar todos estes equipamentos.
    Lulinha estava ainda um pouco atordoado, mas perguntou:
    - Como chama tudo isso e para que serve?
    Isso aqui é uma plataforma e serve para tirar petróleo das profundezas do mar. O petróleo extraído é levado para a terra. Depois é processado para produzir combustíveis que melhoram a qualidade de vida das pessoas e também pioram as condições ambientais da natureza.
    Antonio Orlando era um ambientalista convicto e tinha uma relação de carinho e de amor com a natureza.
    Lulinha estava tonto com tanta informação nova. Nisso, chega uma mulher gritando:
    - Antonio Orlando, você ficou maluco? Por que está aí a conversar com um balde? Eu não mandei que você fosse trocar aquele registro danificado?!
    A mulher se chamava Maria Solange. Ela era a responsável, em nome do gigante, por todas as operações daquela chamada plataforma. Era uma mulher decidida, tinha o rei na barriga e tratava todos de forma muito ríspida. Era uma mulher muito alta e feia.
    Antônio Orlando não teve tempo para responder, pois, nesse momento, ouviu um grande estrondo. Havia começado um incêndio na plataforma. Todos saíram correndo.
    Mas antes, Antônio Orlando jogou o balde com o Lulinha no mar.
    Lulinha não teve alternativa. Começou a descer pelo pé da plataforma. A plataforma não resistiu e afundou. Antonio Orlando e Maria Solange morreram abraçados. Lulinha foi descendo o pé da plataforma, pensando sobre o que iria falar com a sua comunidade. Mas o pior estava por vir.
    À medida que Lulinha ia descendo, observava que a água ficava cada vez mais turva e oleosa. Vilma tinha razão: a situação piorou. Estava ocorrendo um grande vazamento no pé da plataforma.
    Quando Lulinha chegou junto à comunidade, a situação era de desespero. Lulinha inventou que tinha ficado doente. Comunicou a todos que a lagosta Vilma é que iria conduzi-los a uma situação melhor.
    O Polvo passou a dedicar todo o seu tempo para tratar da doença fictícia de Lulinha e parou de reclamar das condições de vida. Só queria saber de garantir a sobrevivência do seu querido Lulinha.
    Vilma, com toda sua competência, assumiu o lugar de Lulinha. Mudou os métodos de trabalho e conduziu todos os frutos do mar daquela região para uma situação muito melhor.

Henrique Capillé e Túlio Mansur

Nenhum comentário:

Postar um comentário