9 de mar. de 2010

O vinho

Chego. Onze e meia, não é tarde, no entanto, ambos mãe a pai dormem na serenidade deste lar. Penso o quanto são coitados; enquanto eu, ausente por horas, deliciava-me ao som de boa musica, boa comida e boa gente, eles aqui permaneceram, não sei se na escuridão da sala ou no breu do quarto. Penso como fui egoísta ao deixá-los aqui sozinhos, a mercê dessa vida estancada. Não sei se devo sentir pena ou amor.
Nesta casa parece não haver vida. Ando, então, rumo ao quarto de meus pais, somente para verificar se dormem tranqüilos e, para minha surpresa, os encontro acordados. Dou-lhes boa noite e um beijo. Um beijo de remorso. Volto a caminhar pela sala, que antes escura, agora se ilumina apenas com uma fresta de luz que vem do quarto de meu irmão mais velho. A luz não alcança muito da cozinha, mas enfatiza uma cena (agora morta) na mesa – vejo que há um pedaço de queijo, ainda fresco, uma garrafa de vinho Malbec e duas taças. O que me encanta sobre elas e que ainda estão meio cheias, e percebo que o vinho fora degustado há apenas alguns minutos.
Agora estou parada, olhando para mim mesma. Como fui tola. Como fui desprezível ao pensar que meus pais permaneceram o tempo todo jogados ao tédio, enquanto, em verdade, gastavam seu tempo em algo mais interessante que eu. Penso como sou tola, mais uma vez. Um vento me beija no rosto, a noite é fria. Hora de ir deitar-me. Ouço os passos do meu pai, escondo-me para ver o que se passa em seu quarto. Ele beira a cama, deita ao lado de minha mãe, e com um beijo de amor, deseja a ela que tenha uma boa noite. E diz que a ama. E com o beijo de meu pai, ela sorri. Agora eu durmo. Durmo, apenas, porque meu corpo está cansado. Porque o que minha mente aspira nesse momento é que a cena da noite se eternize, que pare. E que o vinho nas taças não evapore, jamais.


Luiza Braga

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